quinta-feira, 1 de março de 2018

De abundante à quase extinção, a poaia faz parte da história de Quatro Marcos

           De acordo com o Álbum Gráphico de Mato Grosso, por volta de 1820, Cuiabá voltou a ser sede política e administrativa do Estado e Vila Bela entra em decadência. Neste período surgiu uma indústria doméstica que supriu a necessidade de produtos da terra como farinha de mandioca, arroz, feijão, açúcar, aguardente, azeite de mamona e algodão.
           Por volta de 1830 surge a extração da ipecacuanha ou poaia (Cephaelis ipecacuanha). Nesta época, José Marcelino da Silva Prado, explorando garimpos de diamantes nas imediações do Rio Paraguai, em região próxima à Barra do Bugres, observou que seus garimpeiros usavam, quando doentes, um chá preparado com raiz de arbusto facilmente encontrado à sombra da quase impenetrável floresta da região.
           Tratava-se da “poaia”, que era antiga conhecida dos povos indígenas, que tinham repassado seu conhecimento aos colonizadores. Curioso e interessado, o garimpeiro enviou amostras da planta para análise na Europa, via porto de Cáceres e Corumbá. Desta raiz é extraída a Emetina, substância vegetal largamente utilizada na indústria farmacêutica, principalmente como fixador de corantes, expectorantes, antiamebicidas e anti-inflamatórios. Constatado oficialmente seu valor medicinal, iniciou-se, então, o ciclo econômico da poaia, de longa duração e grandes benefícios para os cofres do Tesouro do Estado.
           Esta planta é extremamente sensível, abundando em solos de alta fertilidade sob árvores de copas bem formadas. Seus principais redutos eram áreas dos municípios de Barra do Bugres e Cáceres. A princípio, os carregamentos seguiam para a metrópoles via Goiás, depois passou a ser levada por via fluvial, com saída ao estuário do Prata. Os poaieiros eram os indivíduos que se propunham a coletar a poaia.
           O poaieiro surgiu em Mato Grosso em fins do século XIX, e foi responsável pelo surgimento de núcleos de povoamento no Estado, graças à sua atividade desbravadora, sempre à procura de novas “manchas” da raiz da poaia. Porém, o próprio poaieiro decretou o (quase) fim desta cultura durante as décadas de 1960 e 1970, pois os “catadores” da poaia somente extraíam as plantas, não faziam o replantio, não seguindo o exemplo dos povos indígenas que, ao subtraírem as raízes da ipeca, as replantavam, garantindo, assim, a perenidade do vegetal.
           Outro fator que contribuiu para a escassez da planta foi o desmatamento desenfreado da região oestina de Mato Grosso, pois a poaia estava acostumada à sombra das matas úmidas, e sucumbiu ante a queda das árvores. A poaia chegou a ser o segundo contribuinte para os cofres da Província de Mato Grosso, devido a sua exportação principalmente para a Europa.
           A pesquisadora Celice Alexandre Silva, doutora em Botânica, estuda a poaia há anos e mantém no Campus da Unemat, em Tangará da Serra, um banco de germoplasma de sete populações de poaia oriundas dos municípios mato-grossenses de Barra do Bugres, Cáceres, Denise, Nova Olímpia, São José dos Quatro Marcos, Tangará da Serra e Vila Bela da Santíssima Trindade.

Reboleira de poaia no banco de germoplasma da Unemat

Reboleira de poaia no banco de germoplasma da Unemat
Fonte: wwww.portalmatogrosso.com.br